Os problemas enfrentados pelo concurso de Miss América

24/09/2018

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24/09/2018 - 14h02min  THE NEW YORK TIMES


Atlantic City, Nova Jersey – Quem assistiu ao Miss América no começo deste mês pode ter notado algumas mudanças.


Para começar, o evento deste ano foi chamado de "competição" e não de "concurso". As participantes eram "candidatas" – em uma entrevista para o cargo de Miss América –, não "concorrentes". Não houve passarela, e a palavra Miss foi retirada das faixas, que, no entanto, ainda tinham um pequeno bolso para esconder o batom.


E, claro, no rastro do movimento #MeToo, não houve desfile de maiô.


Essa foi a estreia da nova e socialmente consciente Miss América – ou "Miss América 2.0", como foi renomeado por sua nova presidente, Gretchen Carlson, que já foi ex-âncora da Fox News e Miss América 1989. As candidatas deste ano, como a introdução ao show na televisão explicou, foram escolhidas com a "diversidade e a inclusão" em mente, eram "empoderadas", "líderes" e "belas – por dentro e por fora".


Entre o grupo havia uma candidata formada em Neurociências pela Universidade Harvard e uma desenvolvedora de software da Microsoft cuja plataforma era mais mulheres na ciência, na tecnologia, na engenharia e na matemática. As candidatas falaram sobre sobreviver a um câncer, crescer com pais na cadeia e seus diplomas em estudos femininos. Elas abordaram temas como violência doméstica, saúde mental e agressão sexual.


Quatro das cinco finalistas, inclusive a vencedora, Nia Imani Franklin, de Nova York, eram negras.



O que talvez não tenha sido visível para aqueles que o assistiram, porém, são as dores cada vez maiores do Miss América 2.0. "É meio que uma guerra civil", afirmou Kirsten Haglund, vencedora de 2008. Nos bastidores, voluntários estaduais e locais tramaram um golpe contra Carlson, e a Miss América vencedora criticou-a no programa "Today".


Grande parte da turbulência tem a ver com a eliminação dos maiôs, a falta de transparência na tomada de decisões e a pressão para encontrar relevância em uma instituição de quase 100 anos neste momento cultural particular. Como Haglund disse: "O Miss América nunca vai voltar a 1950, sua era de ouro. Mas o que poderá ser para o século XXI?".


Uma História de Protesto


Há muito tempo o Miss América se promove como mais do que um concurso de beleza, afirmando – de modo um tanto duvidoso – que é o maior fornecedor de dinheiro para bolsas de estudo para jovens no país.


Há muito tempo também tem sido motivo de escárnio e desprezo, um lembrete de como continuamos a viver em um mundo onde as mulheres são julgadas por seus corpos. Em 2014, as candidatas ainda tinham que assinar um contrato declarando que nunca haviam engravidado. (O manual de 2018 ainda exige que as mulheres declarem que nunca foram casadas, que não estão grávidas e que não têm a intenção de ficar grávidas durante o ano em que vão trabalhar.)


Ao longo dos anos, a organização centenária sofreu a oposição de grupos religiosos e de ativistas dos direitos das mulheres. Lidou com divergências internas – em 1950, a vencedora do concurso, Yolande Betbeze, recusou-se a posar em trajes de banho durante seu reinado – e com pressões externas.


Enfrentou uma pequena revolta feminista quando, 50 anos atrás, ativistas protestaram jogando sutiãs, faixas, cílios postiços e outros "instrumentos de tortura feminina" em uma lata de lixo colocada na passarela com uma placa onde se lia a palavra "liberdade".


Mais tarde, houve aquele ano em que os produtores tentaram reformular a competição como um reality show; a época em que a apresentação se mudou para Las Vegas; e o escândalo de 1984, quando Vanessa Williams, a primeira Miss América negra, perdeu sua coroa depois que fotos dela nua apareceram na Penthouse (a organização do Miss América se desculpou pelo ato).


Mais recentemente, a audiência diminuiu, assim como o número de mulheres que se inscrevem como candidatas. As afirmações de doações de bolsas de estudo foram questionadas e desmascaradas.


"Desde o final dos anos 80, o Miss América vem ajustando sua imagem para manter a relevância e a audiência", afirma Margot Mifflin, professora de Inglês na Universidade da Cidade de Nova York que está escrevendo uma história cultural do concurso. "Parte disso tem a ver com a cultura. Em algum momento as pessoas não precisaram mais ver mulheres seminuas em um palco – elas podiam ver isso em seus computadores."


Hoje, as multidões talvez também tenham se desligado por causa do drama em torno do assunto.


Em dezembro, foi revelado que o executivo-chefe Sam Haskell havia mandado e-mails cruéis e lascivos sobre antigas competidoras, um ato que apenas reforçou a percepção do Miss América como algo retrógrado e sexista.


Carlson, que se tornou uma figura de destaque no movimento #MeToo após seu processo de assédio sexual contra a Fox, apareceu como uma substituta perfeita – alguém que ajudaria a reformular a imagem do concurso.


"Ela parecia uma unanimidade. Nós a vimos como uma líder dissidente", afirma Crystal Lee, vice-campeã de 2014.


No entanto, desde que Carlson assumiu, a organização tem vivido várias turbulências internas. Em agosto, a Miss América 2018, Cara Mund, publicou uma carta aberta acusando Carlson de assédio moral no trabalho. (Uma avaliação independente determinou que "nenhuma das informações coletadas" indicou que Mund havia sido "tratada em uma maneira que poderia ser considerada inapropriada tanto em um ambiente de negócios tradicional quanto neste contexto específico de trabalho".)


Em oito de setembro, um dia antes do concurso, mais de 50 líderes dos estados se encontraram privadamente na sala de convenções de um hotel para expressar seu descontentamento com Carlson e discutir possíveis ações legais.


Suzette Charles, atriz de Nova Jersey que foi Miss América em 1984, afirmou: "É uma bagunça. Parece que é o dia-a-dia, é outra coisa. Eu não paro de pensar: 'Estamos em um filme?'".


Este é o Miss América 2.0


Não é um filme, mas é um show.


E assim, mais ou menos na mesma época em que o encontro estava acontecendo, as competidoras se preparavam para a parada anual Mostrem seus Sapatos, em que as mulheres andam em carros conversíveis ao longo de um calçadão, enfeitadas com trajes elaborados que devem honrar seus estados. (A tradição, contou rindo Karen Nocella, diretora de operações do concurso, vêm dos gritos que os homens costumavam dar às mulheres – "Mostrem seus sapatos!" –, na verdade um código para "Mostrem suas pernas!")


Este ano, o traje de Miss Vermont lembrou as folhas de bordo de seu Estado e o da Miss Alabama tinha a NASA como tema. Miss Geórgia trouxe garrafas de Coca-Cola em seus sapatos e Miss Mississippi enfeitou os dela com balões de ar quente.


As vestimentas das mulheres não contam para a pontuação competitiva. Em vez disso, as candidatas são julgadas por suas respostas de 20 segundos em duas entrevistas, descrições de oito segundo sobre sua plataforma social e política e a apresentação de seus talentos em 90 segundos.


Entre os talentos deste ano havia canto, um tipo de dança folclórica chamada clogging, piano, ventriloquismo, três monólogos – incluindo um de Miss Nebraska, Jessica Shultis, sobre seu diagnóstico de câncer –, uma dança coreografada "com um fantasma" e pintura rápida de Miss Delaware, Joanna Wicks, professora de arte de colégio, que conseguiu desenhar uma interpretação da Mulher Maravilha de cabeça para baixo enquanto dançava ao som de "Confident", de Demi Lovato. Várias dessas apresentações, no entanto, ficaram de fora do especial da televisão, que durou duas horas.


Durante a entrevista, perguntaram a Bridget Oei, estudante de Química Ambiental meio-irlandesa, meio-chinesa de Connecticut, como ela aconselharia mulheres que querem competir, mas não possuem relação com as artes. Foi a chance de abordar algumas das críticas de que a competição deixa de fora as mulheres cujos talentos não são normalmente executados com um vestido sobre o palco, como esportes ou codificação.


"Estamos caminhando para o Miss América 2.0", afirmou Oei. "Temos oportunidade de mostrar quem as mulheres são no palco e fora dele."


Durante a competição preliminar, quando lhe pediram para descrever o "maior problema enfrentado por nosso país hoje", a Miss Virgínia Ocidental, que faz mestrado em Serviço Social, respondeu que era Donald Trump.


Quanto aos trajes de banho, depois do show, Franklin, a nova Miss América, afirmou que estava feliz por não precisar tirar a roupa por causa de uma bolsa de estudos de US$50 mil.


As mulheres, afirmou ela, são mais do que apenas isso.


Por Jessica Bennett e Sara Simon


https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/noticia/2018/09/os-problemas-enfrentados-pelo-concurso-de-miss-america-cjmgjhmlz05rw01px7wnl5c54.html


 

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